Se você passar um tempo sozinho, com pouco contato humano, poderá perceber que consegue seguir uma rotina razoável que implique em cuidar de você, da sua casa e ainda ter tempo para aprender algo novo.
Sem demandas, solicitações e pedidos, a produtividade é bastante acessível.
Mas dentre as tantas ambições que já tive acesso desde que comecei a estudar o tempo, dar aulas e mentorar pessoas, nenhuma delas envolviam um plano de permanecer sozinho.
Nossos relacionamentos tanto profissionais quanto pessoais servem de combustível para nossas realizações e não só precisam, como merecem o nosso tempo. Que fique claro: não estou falando de quantidade, e sim de qualidade.
Dentre todas as milhões de coisas que poderia falar sobre a intersecção da gestão do tempo e dos relacionamentos, hoje vou destacar só uma.
Não por isso algo simples, não por isso algo pequeno, não por isso recorrentemente praticado. Mas de extremo valor e importância.
Quero falar sobre o tempo dedicado a escutar o outro. A premissa básica de um bom diálogo e da criação de todo e qualquer vínculo, permitir que o outro fale e oferecer nossa atenção dedicada, sem querer abreviar a fala, encurtar o raciocínio ou aguardando ansiosamente nossa vez de falar.
Escutar é uma arte e também uma musculatura que precisa ser praticada e exercitada e para isso, precisa de tempo.
Trago aqui algumas palavras de Rubem Alves para finalizar esse assunto:
“Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular. Escutar é complicado e sutil… Parafraseio o Alberto Caeiro: “Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito; é preciso também que haja silêncio dentro da alma”. Daí a dificuldade: a gente não aguenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer… Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil de nossa arrogância e vaidade […]
Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia. Eu comecei a ouvir. Fernando Pessoa conhecia a experiência, e se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras. A música acontece no silêncio. A alma é uma catedral submersa. No fundo do mar – quem faz mergulho sabe – a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos. Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouvimos a melodia que não havia, que de tão linda nos faz chorar."
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